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Naing Ko Ko – Um relato de sofrimento, persistência e perdão

fev 15, 2016

the-rotarian-what-its-likeNaing Ko Ko

Bolsista Rotary pela Paz

University of Queensland, Austrália, 2012-13

Em 1988, quando eu tinha 16 anos, comecei a protestar em favor da democracia, direitos humanos e justiça social pelo meu país de origem, a Birmânia, hoje chamado de Myanmar. Quatro anos depois, fui preso e torturado em um centro de interrogação. Fui algemado e espancado, e não me deixavam dormir. Meus olhos foram tampados com um pano e colocaram um capuz na minha cabeça, de forma que eu não sabia se era dia ou noite. Eles me fizeram as mesmas perguntas milhares de vezes. Depois disso, fui julgado em um tribunal especial, sem direito a advogado e enviado diretamente para a prisão.

Eles não queriam que a gente aprendesse nada na prisão, mas eu tinha o sonho de estudar no exterior quando fosse libertado. Eu convenci um guarda a contrabandear para mim um dicionário em inglês e livros sobre economia e filosofia. Cavei um buraco na parede da minha cela para esconder os livros e o cobri com uma foto do Buda.

Um dia eu caí no sono e por isso não escondi os livros. Como resultado deste descuido eu fui descoberto. Eles me transferiram para a cela onde mantinham os cachorros. Fui colocado no meio de uma matilha e obrigado a agir como um cão. Eles chamavam meu nome, “Naing Ko Ko!”, e eu tinha que responder “Au! Au!”. Quando os guardas se aproximavam eu tinha que me ajoelhar e olhar para baixo. Eles colocavam a comida no chão e eu tinha que comer sem usar minhas mãos. Eles também faziam isso com a água.

Naquele momento eu percebi que iria morrer naquela prisão se continuasse lutando e sendo teimoso. Eu sabia que tinha que aceitar a realidade e controlar a minha mente. Muitos prisioneiros cometeram suicídio, e eu não queria ser derrotado daquela maneira. Eu não queria morrer na frente daqueles guardas desumanos.

No entanto, eu tinha que lembrar que estes guardas não haviam recebido nenhum tipo de educação. Eles eram parte de um sistema. Então, eu comecei a conversar com eles. Eu dizia: “Nós somos apenas estudantes, e não assassinos e criminosos. Nós só queremos o direito de aprender e de viver em uma democracia”. Eu tentei explicar o máximo que pude, usando as palavras de Martin Luther King Jr. e Gandhi.

Muitos deles nem me respondiam, mas eu continuava falando. Eu fiz com que minha voz fosse ouvida. Depois de inúmeras tentativas eles começaram a me responder. Depois de um tempo, eu me tornei amigo de muitos deles.

Depois de seis anos e oito meses eu fui libertado. Agora, eu estou realizando o meu sonho de estudar no exterior, na Australian National University, em Canberra. De todas as pessoas que foram presas durante os protestos, eu acho que sou o único que está fazendo doutorado.

Mais de 3.000 pessoas morreram durante os protestos a favor da democracia em 1988, e milhares foram presas. Nós ficamos conhecidos como “Geração 88” pela nossa luta pela democracia e direitos humanos.

Nós não devemos nos esquecer do que passamos, mas devemos perdoar. Caso contrário, nunca conseguiremos seguir com as nossas vidas. Não se pode fazer uma democracia com ódio no coração. Deve haver perdão. É importante falarmos sobre justiça, e que vingança e justiça não são a mesma coisa.

Para mim, a melhor vingança é me tornar uma pessoa que trabalha para mudar meu país de forma sistemática. Quero voltar para Myanmar e me tornar conselheiro chefe de políticas da nação. Quero trabalhar em programas anticorrupção, contra a pobreza e justiça social, e acima de tudo em um processo para pacificação. Quero que o local onde fui torturado se torne um museu, para que essa parte de nossa história nunca seja esquecida nem repetida.

Saiba como se tornar um Bolsista Rotary pela Paz ou apoiar os nossos Centros em www.rotary.org/peace-fellowships.

* Relato feito a Steve Almond (The Rotarian)

** Ilustração: Gwen Keraval

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