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Democracia se faz com política
Diante de todos os acontecimentos dos últimos meses e principalmente diante das grandes manifestações de junho deste ano, fico, sem demagogia, emocionado. Por isso é difícil ficar sem falar sobre o que está ocorrendo.
Quem tem a minha idade sabe o que estou falando, ou melhor, sentindo. Nascida em 64, a minha geração não teve nenhuma educação política. Vivemos em uma ditadura até os anos 80 onde a “ignorância cidadã”, termo que cunho neste momento para sintetizar a falta de noção de direitos, era imensa. Renato já dizia que éramos filhos da revolução, burgueses sem religião, o futuro da nação, geração Coca-Cola. Ou seja, a meu ver, algo perdido, dentro do tempo, na história. No fundo, como só o plantio é opcional, éramos fruto de um paradoxal senso comum: Todo o político é ladrão! Pois, cresci, e acredito que a grande maioria dos meus amigos, ouvindo isto.
A resultante dessa afirmação, uma vez que ninguém em juízo perfeito gosta de ser considerado ladrão, era o afastamento imediato de qualquer assunto relacionado à política. Por outro lado, ela só acontecia por que havia uma imensa insatisfação da sociedade com relação à atuação dos políticos na ocasião.
Ora, se havia insatisfação com a classe política, por que, sabendo da necessidade de políticos para a democracia, ou qualquer mudança de regime para um melhor bem estar do povo, ao invés de, simplesmente, nos ensinar a repugnar a política, não éramos incentivados a estudar administração pública, ciência política, entre outras matérias, que nos tornassem melhores do que àqueles que nos representavam até então? Penso que nossos pais tinham medo. Os porões da ditadura, apesar de eu nunca ter visto um, assombrava o imaginário.
Mas, e quanto a nós, adultos dos anos 80, 90 e 2000, o que fizemos para a mudança deste pensamento? Nada!
Digo a todos que converso sobre o assunto, que o maior problema da política brasileira ainda continua sendo esta afirmação: Todo o político é ladrão! Uma afirmação sem nenhuma reflexão sobre o seu desdobramento real. E assim, continuamos apoiando em nossas famílias a formação de advogados, engenheiros, médicos, arquitetos, dentistas, etc. É um orgulho termos filhos exercendo estas profissões. Mas política, não.
Em função disso, não há mudança, politica vira algo hereditário, e, dando continuidade às atuações de seus predecessores, todo o político continua ladrão.
Para mudar a forma de se fazer política, precisamos formar políticos com vocação de verdade. Precisamos, no seio da família, mudar o pensamento sobre política. E, uma vez identificados os talentos para o exercício da profissão, temos que ter coragem e dar apoio à sua formação.
Politico, é preciso que se diga, vivendo exclusivamente da profissão, ganha tão bem quanto um dentista. Consegue viver dignamente e, fazendo valer, de fato, o voto que lhe foi concedido, entra para a história. A sociedade, de uma forma geral, já deixou cair velhos preconceitos sobre muitas profissões que antes eram tão rejeitadas quanto a de político.
Precisamos deixar cair mais este.
Pois, apesar de estar nas ruas, essa multidão de jovens precisa saber como fazer mudar.
Não adianta simplesmente apoiá-los a ir às ruas, a gritar palavras de ordens, pintar cartazes e pedir de tudo um pouco. Em primeiro lugar, ninguém pode ser tudo para todo mundo. Posicionamento e organização são fundamentais para se alcançar algo em política. Como dizia um comercial que vi há muito tempo: “Potencia sem controle não é nada”.
Democracia se faz com política. Política, com políticos. Políticos, mudando a postura e incentivando a formação. Sem representação os tiros acabam caindo n´água.
* O autor é Benito Corbal, associado ao Rotary Club de São Gonçalo, RJ (distrito 4750). Empresário com MBA em antropologia do consumo pela Coppead e gestão de serviços pelo Ibmec, há 20 anos desenvolve estratégias de serviços em diversos segmentos do mercado.
** Foto: Stock.XCHNG.