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Premiado pelo Rotary International, projeto do Rotaract ajudou uma cidade paulista a falar de suicídio

set 10, 2019

Em 2015, a tranquilidade de Itápolis, no interior de São Paulo, foi abalada por uma sequência de suicídios. Num curto espaço de tempo, três ilustres moradores da cidade tiraram a própria vida. “Temos 40 mil habitantes, aqui boa parte das pessoas se conhece. Estávamos chocados e assustados”, recorda o engenheiro cartógrafo e funcionário público Guilherme Ramires Henrique, associado ao Rotaract Club de Itápolis (distrito 4480).

Ao longo de semanas, o assunto foi debatido nas reuniões do clube. Os rotaractianos desejavam reagir à tragédia de alguma forma, mas tinham receio de que a população entendesse aquilo como uma tentativa do clube de se promover. “Era preciso respeitar a dor das famílias”, explica o rotaractiano.

Uma ação simples e discreta foi a alternativa encontrada. Depois de conversarem com alguns psicólogos, Guilherme e seus companheiros passaram o mês de setembro nas ruas de Itápolis, distribuindo panfletos sobre o mês de prevenção do suicídio (o Setembro Amarelo, que acabou batizando a ação do clube) e fitas amarelas – mesma cor que estampou as vitrines do comércio local, que abraçou a iniciativa dos rotaractianos.

Uma história pessoal
Se o plano era fazer um trabalho pontual, alguns acasos levaram o clube a transformá-lo em projeto, agendando outra edição para 2016. Um desses motivos envolvia o próprio Guilherme, coordenador do Setembro Amarelo. “É uma história pessoal, talvez poucas pessoas saibam”, ele conta. Depois de largar o emprego numa boa empresa, com bom salário, para se dedicar exclusivamente ao sonho do mestrado numa universidade pública, Guilherme não resistiu à pressão gerada por aulas, provas, trabalhos e estudos dirigidos. Depois de nove meses lutando com a situação, ele acabou diagnosticado com depressão. “Por duas vezes, pensei em cometer suicídio”, revela.

Após largar o mestrado, que acabou não concluindo, e renunciar à presidência do clube que assumiria no ano seguinte, em julho de 2016 Guilherme foi buscar auxílio psicológico. “Depois de dois meses eu já estava de volta ao clube, em atividade”, comemora. Faltando pouco para setembro, ele lançou a ideia aos companheiros de clube: por que não retomar o Setembro Amarelo em 2016? “Há sempre alguém precisando”, ele conta, e aqui é impossível não pensar na luta que ele mesmo travou com a depressão. “Tentei não expor ao clube o que aconteceu comigo, mas eles imaginam o que houve.”

A cidade se abre
Se “Falar é a melhor solução”, frase utilizada em algumas das peças de divulgação do projeto, algumas pessoas viram no trabalho do Rotaract uma possibilidade de abrir o coração. “Durante as panfletagens daquela segunda edição, em 2016, percebemos que as pessoas de mais idade estavam preocupadas com o problema”, Guilherme lembra. “Uma senhora disse que estava assustada em como o suicídio e a depressão haviam ‘invadido’ Itápolis, uma cidade pequena. Talvez algumas pessoas vejam depressão e suicídio como doenças de cidade grande”. Uma estudante universitária disse que levaria o assunto para a sala de aula, pois as provas finais estavam chegando, período que costuma afetar bastante a saúde mental e emocional dos alunos – pressão que Guilherme conheceu de perto.

O projeto teve uma terceira edição em 2017, então com foco especial nas escolas, onde a preocupação tinha nome: o jogo da Baleia Azul, suposto fenômeno surgido nas redes sociais que acabou relacionado ao aumento de suicídios entre adolescentes no mundo inteiro. Em uma escola de Itápolis, duas tentativas foram notificadas. “Fomos até lá e conversamos com as turmas do nono ano. De maneira leve, falamos sobre o sentido da vida. Notamos que questões como ‘O que eu quero para o futuro?’ também afetam as crianças.”

Presente de aniversário
Durante os três anos em que foi realizado, o projeto do Rotaract Club de Itápolis organizou palestras abertas à comunidade e ganhou espaços em jornais e emissoras de rádio. O clube estima que pelo menos metade dos itapolitanos foi atingida por essa mensagem. Guilherme comemora: “Ficamos felizes em ver que o suicídio deixou de ser um tabu na cidade, que hoje o assunto é comentado abertamente nas mesas de bar”.

Por todas essas razões, há três meses o Setembro Amarelo recebeu do Rotary International o importante prêmio Rotaract Outstanding Project Awards 2018-19. O projeto do Rotaract Club de Itápolis foi considerado o melhor em toda a América Latina. A premiação chega num momento especial: em 2019 o clube completa 20 anos de fundação – e está prestes a receber mais dois associados, depois de ter visto o quadro associativo dobrar, de oito para 16 integrantes, nos últimos três anos.

O trabalho à comunidade é a grande marca do clube. A meta anual, sempre batida, é de pelo menos 30 projetos, ações, campanhas e parcerias. “Tentamos diminuir nossa velocidade, mas é difícil”, Guilherme confessa. “A gente sempre dá um jeito de fazer tudo que é sugerido ou necessário à comunidade.”

Guilherme explica que, por ora, o Setembro Amarelo não terá nova edição. “Nossa ideia é que o projeto seja absorvido pela comunidade e caminhe sozinho.” O mais importante é que a semente da vida já foi lançada na cidade: desde a primeira edição do Setembro Amarelo, naquele triste ano de 2015, nenhum caso de suicídio foi registrado em Itápolis.

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