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O convívio construindo identidades

nov 6, 2017

Thaís Ribeiro tinha nove anos quando passou pela primeira vez pelos portões da Fundação de Rotarianos de São Paulo, na Granja Viana. Foi lá, no Centro de Educação para Surdos Rio Branco, que ela aprendeu a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e se alfabetizou em português, antes de tornar-se aluna do Colégio Rio Branco. Hoje com 24 anos, formada em pedagogia pelas Faculdades Integradas Rio Branco, Thaís continua indo à escola todos os dias, só que agora como educadora, ajudando outras crianças como ela a descobrir seu papel no mundo. “Aqui eu encontrei minha identidade”, ela nos conta, enquanto leva um grupo de alunos de volta à sala de aula depois do recreio. A história de Thaís ilustra bem a proposta educacional da escola: promover o respeito às diferenças por meio da efetiva inclusão da minoria surda numa sociedade majoritariamente ouvinte. Criado em 1977, hoje com 69 alunos matriculados, o Centro de Educação para Surdos Rio Branco oferece educação gratuita a crianças e jovens surdos provenientes de famílias de baixa renda – de uns tempos para cá, um certo número de alunos pagantes também passou a ser admitido.

Um aspecto central dessa inclusão é a interação dos alunos com seus familiares. Ao matricular seus filhos na escola, as famílias assumem o compromisso de participar do curso de Libras, também gratuito, e de compartilhar uma série de atividades promovidas pelos educadores para estimular a comunicação entre pais e filhos – muitas delas feitas num espaço que reproduz uma casa adaptada para crianças surdas, com paredes mais baixas entre os cômodos para facilitar a comunicação visual. A história de Thaís também nos mostra que o Brasil precisa avançar muito na maneira como lidamos com a pessoa surda – porque as oportunidades que Thaís teve são, infelizmente, uma exceção. Segundo a Organização Mundial da Saúde, 10% da população mundial apresenta algum tipo de problema auditivo. No Brasil, de acordo com o Censo de 2000, há 5,75 milhões de surdos. Mas segundo outra estatística, gerada pelo Censo Escolar de 2003, apenas 344 brasileiros com surdez estavam matriculados nas universidades brasileiras. “As pessoas têm a ideia de que incluir uma criança surda é colocá-la no mesmo espaço físico das outras. Mas aqui a gente parte do princípio de que incluir uma criança é dar a ela a mesma oportunidade de aprender e evoluir que é dada às outras”, explica Sabine Vergamini, diretora da escola, mostrando que o modelo pedagógico da instituição propõe um caminho intermediário entre aquele que defende a permanência das crianças surdas em escolas especiais por toda a vida (excluindo-as de experiências e oportunidades que as pessoas ouvintes têm) e aquele que advoga o fim das escolas especiais e a admissão da criança surda desde cedo em escolas regulares – o que provoca verdadeiras tragédias pessoais quando sabemos que essa “inclusão” é feita quase sempre sem preparo e as adaptações pedagógicas necessárias.

THAÍS RIBEIRO, a aluna que virou professora: uma história de vida que resume a missão pedagógica da escola de incluir promovendo oportunidades

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INCLUSÃO DESDE CEDO

O ideal é que a criança com surdez tenha contato com a Libras e outras crianças surdas o mais cedo possível, o que na Escola da Granja Viana é estimulado já na faixa etária de até três anos. Lá, metade dos professores são surdos. “Com eles, os alunos veem desde muito cedo que um surdo pode estudar, casar e ter filhos”, Sabine explica. Essa etapa inicial do processo pedagógico é importante também para os pais, que passam a conviver e trocar experiências com outras famílias. Entre os três e os cinco anos, as crianças começam a frequentar aulas regulares de educação infantil, complementadas por atividades esportivas, culturais e de socialização desenvolvidas em parceria com os alunos ouvintes da unidade de Granja Viana do Colégio Rio Branco. O projeto segue por mais duas etapas, terminando com a inclusão dos alunos surdos, como bolsistas, em classes regulares do Colégio Rio Branco e de instituições parceiras, nas quais são acompanhados, sem qualquer custo, por tradutores e intérpretes de Libras e língua portuguesa. Esse convívio entre alunos surdos e ouvintes é uma marca do Centro de Educação para Surdos Rio Branco – e uma experiência definitiva para todos eles. E nos mostra que aquilo que consideramos ser diferente ou limitador é algo bem relativo, que pode ser redefi nido pela educação. Como na história de uma família em que o pai, a mãe e um dos fi lhos eram surdos, e cuja difi culdade era justamente adaptar-se ao outro f lho, ouvinte – e a maior preocupa- ção da escola, neste caso, passou a ser justamente com ele. “A mãe nos disse que precisou aprender a ter um fi lho ouvinte, e que a casa deles precisava de um aparelho de som, porque aquilo era importante para o menino”, Sabine lembra. “Aqui nós educamos para a diferença”.

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